segunda-feira, 20 de maio de 2013

Restaurando Amassados - A Funilaria Artesanal

Muitos procedimentos foram criados para desamassar carros, todos produzidos pela criatividade dos restauradores que evoluem tanto quanto evoluem os veículos. Entretanto nenhum destes procedimentos possui um custo menor e/ou um resultado mais eficiente que o da técnica da funilaria artesanal. Usamos o termo "artesanal" devido ao fato de que ela é toda manual, sem máquinas especiais, somente ferramentas simples (muitas construídas e/ou adaptadas pelo próprio funileiro).


No trabalho realizado para ilustrar esta postagem, utilizei na primeira fase do restauro (a fase de desamassamento) as ferramentas mostradas na foto ao lado: Da esquerda para a direita, tasso em curva, abrasadeira, tasso cunha, marreta de borracha, martelo macio, martelo de chapeação com ponta, talhadeira longa sem ponta, talhadeira curta sem ponta, alavanca de borracheiro e haste dobrada de vergalhão. Notem que os quatro últimos são ferramentas adaptadas segundo a necessidade, a pratica e a eficiência.

Na foto ao lado, a tampa traseira de um Palio Fire após ter sido danificada por uma colisão. O cliente espera que o orçamento do reparo inclua a troca da tampa, o material e a mão-de-obra da pintura da tampa nova e evidentemente o valor da tampa nova, já que ele não quer (obviamente) que seu carro apresente indícios de que foi amassado. São apresentados a ele dois orçamentos: Um com a troca da tampa e outro reparando a tampa amassada. Como uma tampa nova seria pintada inteira (por dentro inclusive), consideramos a mão-de-obra da troca da tampa mais demorada e difícil do que o restauro e retoque da tampa danificada (que seria repintada somente por fora após a funilaria artesanal ser aplicada). Portanto o restauro sai muito mais barato do que a troca. E fica bom? Pergunta o cliente. Sim, e garantido! Confiando no parecer profissional a ele dado o cliente autoriza o restauro, agora mãos a obra...

A primeira etapa do restauro é a analise do amassado: Vamos definir os abalos mais profundos, o epicentro da batida (normalmente o local mais afundado), os locais abaulados para fora, abaulados para dentro, vincos originais distorcidos e vincos agudos originados pela batida. Todos identificados nesta batida. Na foto ao lado (clique na foto para ver melhor) as setas azuis apontam os calombos ou abaulados para fora, as setas vermelhas apontam para os afundados, as linhas tracejadas em vermelho os vincos originais distorcidos, sendo que entre as linhas tracejadas identificamos o epicentro da batida.

É feita a desmontagem de todas as peças que dificultariam o trabalho, inclusive do vidro. Removida a forração interna  usamos a alavanca para empurrar para fora os afundados mais profundos, nesta operação a alavanca é apoiada na chapa interna da tampa. Vamos atacando o amassado a partir do seu epicentro. Observe na foto ao lado que houve uma grande melhora no formato do vinco inferior, mas os abalos mais agudos, apesar de diminuídos, continuam todos lá. Com esta primeira investida bem sucedida, pois o amassado diminuiu, vamos atacar os abaulados para fora (aqueles identificados pelas setas azuis).

Usando a marreta de borracha, para não causar distensão na espessura da chapa (um cuidado que deve ser tomado do começo ao fim do trabalho), vamos rebater os abaulados para fora (ou calombos). Na foto ao lado eu  ainda aproveitei a marreta de borracha para diminuir mais ainda o amassado batendo sobre pontos apoiados internamente, usando o principio da ação e reação, que é a base da funilaria artesanal. Na foto a seguir tentarei demonstrar na prática como isto funciona, detalhadamente.

Como disse, a base do trabalho de restauração de amassados está no conceito de ação e reação, ou seja: cada ação aplicada na chapa é devolvida por ela no sentido inverso. Desta forma podemos trazer os locais afundados para fora pressionando internamente sobre os mesmos, simultaneamente a ação de bater, que no caso de um afundado, é realizada com uma ferramenta chamada de "lima abrasadeira" ou simplesmente abrasadeira. Já para os pontos que identificamos como altos, usamos o martelo de funileiro ou martelo de chapeação, porem não pressionamos internamente pois queremos que o calombo recue. Na foto ao lado, toda a área do amassado foi rebatida.

Após considerarmos satisfatório o resultado conseguido na etapa de rebatimentos, passamos para o nivelamento com acréscimo de material e lixamento (foto ao lado). Usando o taco em uma lixa 60 de papel, começamos a promover o nivelamento a partir do material existente na própria peça. Sempre manualmente para não comprometer grandes áreas do revestimento anti-ferrugem e muito menos diminuir a espessura da chapa original, que ocorreria se usássemos máquinas elétricas. O trabalho manual pode parecer mais demorado e difícil mas é a melhor forma de controlar os resultados, pois sentimos os desníveis e retrabalhamos e corrigimos os mesmos.

Para a  próxima etapa, primeiramente nos certificamos que não há em nenhuma área material solto e oleosidade, retiramos a poeira com o gatilho de ar e iniciamos a aplicação da massa niveladora, que pode ser a massa plástica light de baixa densidade ou a massa poliéster. Ambas quando bem preparadas e utilizadas não comprometem os resultados do conserto mesmo após a ação do tempo. Quase todos os defeitos que surgem em decorrência do uso de massas devem-se a erros na aplicação ou no preparo. A aplicação deve ser sempre direcionada, usamos o aplicador como se fosse também um nivelador, retirando excessos e remanejando o material ainda pastoso, mas devemos ser rápidos pois a massa logo fica imprópria para o manuseio devido ao processo de cura ser disparado logo após a mistura do catalizador. Ao lado esta etapa concluída.

Cada etapa quando bem concluída facilita a consecução da próxima, portanto devemos caprichar ao máximo em cada momento do trabalho, mas sempre levando em consideração que as etapas estão interligadas, podendo ser retrabalhadas a qualquer momento, sobretudo na etapa ao lado (lixamento da massa). Efetuamos o lixamento sempre com tacos e após lixarmos toda a área danificada fazemos os repasses de massa nos locais ainda com defeitos de nível ou porosidades. A foto ao lado mostra justamente este momento.

A funilaria artesanal (especificamente) já foi concluída a quatro etapas, mas como é de praxe, seguimos com a preparação, corrigindo e melhorando o restauro nas etapas posteriores, pois um restaurador deve dominar um trabalho do começo ao fim, absolvendo técnicas de diferentes atividades, neste reparo efetuamos os trabalhos de funileiro, vidraceiro e pintor. Na foto ao lado a peça está selada com o primer, a massa plástica foi lixada até a grana 220 à seco e após o primer houve correções com massa rápida nos poros e riscos remanescentes.

Estando pronta a preparação, reduzimos o lixamento até a grana 400 e iniciamos a aplicação da base poliéster até a cobertura total do primer e das manchas da massa rápida. Normalmente, riscos na superfície ainda permanecem (minimamente) pois o poliéster tem pouco poder de cobertura, corrigimos com o lixamento da base com lixa 600 (com água) para então prosseguirmos aplicando camadas leves e secas para encobrir os riscos causados pela lixa 600.

Consumado a aplicação da base poliéster, efetuamos a aplicação do verniz P.U., são duas passadas obrigatórias, mas eu sempre aplico uma terceira mais fina para garantir o polimento (como já comentei em outras postagens). Aguardamos no minimo quatro horas para efetuarmos a montagem e o polimento. O tempo total que levei para realizar este trabalho foi de três dias e meio e a chave-mestra para a consecução do mesmo foi a tradicional técnica da funilaria artesanal, que basicamente é a mesma desde os primórdios da profissão porem, dado as mudanças sofridas pela espessura e tratamento das latarias automotivas, foi adaptada  para os dias atuais. Ela demonstra sobretudo, que em funilaria automotiva a capacidade do profissional pode superar os recursos e métodos hoje disponibilizados.




Quaisquer dúvidas, sugestões para postagens futuras, criticas e comentários fiquem a vontade... Até a próxima!